Comprei esse livro faz uns dois meses e finalmente consigo trazer uma breve resenha sobre o tema abordado. Quem acompanha meus artigos aqui no Psico Educa sabe que tenho uma quedinha pela psicanálise, não é atoa que a maioria das resenhas que faço no Portal é a respeito de livros psicanalíticos. Achei o assunto do livro muito interessante e adoraria saber qual a visão da psicanálise sobre os contos de fadas e como ela explica essa interação entre o real e o imaginário na perspectiva da criança, então decidi comprar o livro em uma das minhas andanças mensais pelas livrarias do Iguatemi (Shopping de Campinas/SP). Resultado: Amei o livro, o Bruno (autor) disserta com uma riqueza de detalhes surpreendente e entrega o conteúdo com uma clareza didática que encontro em poucos livros. Entretanto, achei a leitura um pouco cansativa pois há muita repetição sobre os conceitos já discutidos no livro; mas isso não tira o valor e minha recomendação, infelizmente essa "repetição" é necessária para que se fique claro o que o autor pretende defender - além de ser apenas a minha opinião. Então, leia e tire suas próprias conclusões porque independente das suas referências teóricas - dentro da psicologia - o livro é muito bom e nos da uma outra perspectiva a respeito do imaginário infantil.
Autor: Bruno Bettelheim
Título: A Psicanálise dos Contos de Fadas.
Título Original: The uses of Enchantment the Meaning and Importance of Fairy Tales.
Ano de Publicação: 2016.
Capa: Gabinete de Artes.
Editora: Paz e Terra.
"Em A Psicanálise dos Contos de Fadas, Bruno Bettelheim, faz uma radiografia das mais famosas histórias para crianças, extraindo-lhes o seu verdadeiro significado."
Os contos de fadas, considerados por pais e educadores até pouco tempo como irreais, falsos e cheios de crueldade, são, para as crianças, o que há de mais real, por lhes falar, em linguagem mágica, sobre o que é real dentro delas. Os pais temem que os contos de fadas afastem as crianças da realidade, por meio do encantamento e da fantasia. Porém, o real, a que os adultos comumente se referem, é o extremo, é o mundo circundante, talvez mais cruel do que o das fadas; o conto de fadas, por outro lado, fala de um mundo fantástico, que é bem mais real para as crianças. Isto fica ainda mais claro quando as histórias se situam na "Terra do Nunca", ou no "Era uma vez um país um longe...", ou "Numa época em que os bichos falavam", evidenciando, assim, que não se trata do aqui, nem do agora da realidade adulta, mas de um território fora do tempo e do espaço.
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Logo nos primeiros capítulos o autor nos chama atenção quanto a diferença de fábula e conto de fada. Ele diz: "Obviamente , nem toda história contida numa coleção intitulada "Contos de Fadas" está de acordo com esses critérios. Muitas dessas histórias são simplesmente divertimentos, contos admonitórios ou fábulas. Se são fábulas, dizem por meio de palavras, ações ou acontecimentos - por fabulosos que estes possam ser - o que alguém deve fazer. As fábulas solicitam e ameaçam - elas são moralistas - ou apenas entretêm". Logo, só os contos de fadas são capazes de proporcionar projeções mentais na criança fazendo com pressões do inconsciente sejam aliviadas.
O autor enfatiza que todos os profundos conflitos íntimos que têm origem em nossas pulsões primitivas e emoções violentas são negados em grande parte pela literatura infantil moderna, dessa forma tais contos não seriam suficientemente aproveitáveis pela criança. Somente o conto de fadas leva realmente a sério essas angústias e dilemas existenciais e se dirige diretamente a eles: a necessidade de ser amado e o medo de ser considerado sem valor, por exemplo. Se aplicarmos o método psicanalítico da personalidade humana, os contos de fadas transmitem importantes mensagens à mente consciente, à pré-consciente e à inconsciente.
"[...] Essas histórias falam ao ego que desabrocha e encorajam o seu desenvolvimento, ao mesmo tempo que aliviam pressões pré-inconsciente e inconscientes", (Pag. 13).
Em outras palavras, através dessas histórias poderemos proporcionar as nossas crianças formas de aprendizagem que estejam de acordo com o desabrochar do seu ego, ou seja, os contos de fadas proporcionam um refúgio e um meio de solução para os seus conflitos internos. Os contos de fadas não são moralistas, não ensinam diretamente o que é certo e errado mas ajuda a criança a abstrair e moldar de forma saudável o seu superego; de forma indireta, a criança constrói o seu senso moral e aprende lidar com seus problemas. Mas para que isso ocorra, o autor descarta (como já mencionado) as fábulas, contos modernos, etc, ele resgata os antigos contos de fadas - principalmente os dos "Irmãos Grimm" - dizendo que somente eles podem ajudar a criança a dominar os seus problemas psicológicos do crescimento.
Ele diz que a criança precisa entender o que está se passando dentro do seu eu consciente para que possa também enfrentar o que se passa em seu inconsciente e é nesse ponto que entra os contos de fadas, a criança não conseguiria lidar com eles (e não consegue) de forma consciente, fazendo com que ela recorra a devaneios; justamente o que os contos de fadas proporcionam, fazem com que ela molde os conteúdos inconscientes às fantasias do consciente, e esse processo a capacita a lidar com esse conteúdo. O conto de fadas proporcionará novas "dimensões à imaginação da criança que ela seria incapaz de descobrir por si só de modo tão verdadeiro. Mais com as quais ela pode estruturar seus devaneios e com eles dar melhor direção à sua vida," (Pag. 14).
Os contos auxiliam a criança na superação de dilemas edipianos, rivalidades fraternas e decepções narcisistas; tornando-se capaz de abandonar dependências infantis; adquirindo um sentimento de individualidade e de autoestima e um sentido de obrigação moral.
Bettelheim menciona, ainda, diversos aspectos comuns para os vários contos, nesses as crianças relacionam os personagens com os adultos que as rodeiam. Podemos ter por exemplo a bruxa: A bruxa, "em seus aspectos opostos é a reencarnação da mãe inteiramente boa na infância e da mãe totalmente má da crise edípica" (Pag. 119). A criança pode projetar todo seu "descontentamento" com a mãe nesse personagem, relacionando-o; do contrário não conseguiria de forma consciente para com aquela pessoa que também é boa, a mãe.
O conto dos Três Porquinhos, por exemplo, pode ajudar a criança a desenvolver o Princípio de Realidade. Ela entende que se entregar ao prazer - retratado pelo dois porquinhos mais novos - não será tão satisfatório e é preferível adiar tal satisfação e "construir uma casinha de tijolos" porque só ai conseguirá desfrutar da vida; aprende a adiar a satisfação imediata e a "se proteger do lobo". Ela tira suas próprias conclusões sobre o que fazer, entende que a preguiça e a comodidade não levam a nada.
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Há vários outros contos que Bettelheim retira significado, só lendo o livro para saber mais sobre seus aspectos. Contudo, devemos ressaltar que nem todas as crianças vão ter a mesma interpretação da leitura dos contos, porque cada uma perceberá a sua maneira, relacionando-os com experiências já vividas e com o contexto em que está inserida e, para que os contos possam melhor serem absorvidos pela criança, o autor destaca a necessidade de que devem ser contados para a criança e não lidos por ela, assim a criança poderá imaginar livremente sobre a história e retirar seus significados. Outra ressalva que o autor faz é que não se deve ler um conto diferente por noite, a construção de significados subjetivos que a criança faz se da através da repetição e abstração que ela própria fará. Portanto, os contos de fadas podem ser de grande ajuda para o crescimento da criança, ajudando-a com seus conflitos internos e intelectuais; Além de proporcionar entretenimento e um momento entre pais e filhos. Lembramos também que Bettelheim afirma que os adultos também podem se beneficiar com os contos de fadas. Ficou curioso? Leia na integra o livro que tenho certeza que será uma ótima aquisição.
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